segunda-feira, 8 de outubro de 2012



Joinville ontem e hoje, eu vi!
                A diferença fundamental entre a cidade que eu vi ontem e a cidade que eu vejo hoje é a liberdade.
                Lembro bem que ontem eu era o caboclo para os pais das minhas namoradas. Meu amigo negro era abordado pelas autoridades na mesa do bar, embora estivesse apenas tomando uma cerveja. A nossa diversão, ontem, era ir à recreativa da empresa para comer, beber e conversar. Era porque a conta vinha descontada na folha de pagamento e a comida era relativamente barata. Ontem, a gente sonhava com um lugarzinho ao ar livre em que a gente pudesse jogar futebol, basquete, para andar de skate ou, simplesmente, para se encontrar.
                Ontem, tinham poucas faculdades por aqui. A universidade era uma Fundação e a gente queria porque queria que tivesse eleições diretas para o reitor e queria também criar um Diretório Central dos Estudantes, um DCE. E conseguimos as duas coisas. Putz! Que bons tempos estes, do Daf, o Diretório Acadêmico de Filosofia, a sala C7. Ontem, a gente conversava bastante com os estudantes de Itajaí e Blumenau. Os de Blumenau, uma vez, numa discussão acirrada com a gente, os joinvilenses, tiveram o destempero de dizer: “É! Em Joinville vocês têm o Jec, aqui em Blumenau nós temos o Carlos Gomes”, referindo-se ao Teatro Municipal deles. Jogo duro, jogo baixo! Putz! Uma porrada! Acho que eu nunca tinha ficado tão ofendido. Brabo! Chateado! Mas eles tinham razão. Uma verdade que doeu. Ontem, eu sentia uma felicidade muito grande porque via muitas bandas de rock começando a aparecer na cidade. Mas ninguém fez sucesso nacional, uma pena!  
               Ontem, também tinha teatro. Tinha uma feira de artesanato bem grande na Rua do Príncipe, que ia quase até a Catedral.  Entretanto, eu acho que os governantes não gostavam muito dessa ideia não. Imagine! Estávamos no momento da abertura política. Nem tinham eleições diretas ainda no país. Logo, teatro, música, artes plásticas, literatura, etc era tudo muito de contestação. E isso poderia fazer mal a alguma coisa.
              Anteontem, na política, não tinha CPI na Câmara Municipal.  A primeira aprovada, ontem,  foi a Fundação Cultural e por apenas um voto a mais. Ontem, eu via que os mais ricos e tradicionais estudavam no Bom Jesus, os mais pobres, mas muito atuantes no debate social, no Celso Ramos.  Ontem, os pais das namoradas, antes delas serem namoradas, perguntavam: “mas qual é mesmo o seu sobrenome, você é filho de quem?”. A gente tinha que ser descendente de alguém, de alguma coisa importante.   Ontem, a gente dizia que os restaurantes fechavam para o almoço. Lembro também que, ontem, os poucos barzinhos que existiam tinham o costume de colocar as cadeiras sobre as mesas para avisar aos clientes, “educadamente”, que estavam fechando.  
             Tinha um cinema grande, ontem. Com o tempo a gente ouvia o barulho dos ratos que passavam abaixo do assoalho, debaixo dos nossos pés. Era como um efeito especial durante as sessões. Aliás, até hoje eu não sei bem se isso era uma lenda urbana ou acontecia mesmo. No ontem dos anos 80, quem usava ônibus era obrigado a andar confinado, com as janelas “travadas” pelas empresas. Era porque, se abertas pelos passageiros, podia pegar chuva e molhar os bancos e limpar dava trabalho. Daí era melhor fechar “pra sempre mesmo”. Ontem, a gente via pessoas “morando” debaixo das marquises, como na rua 7 de setembro, num prédio onde foi um supermercado. Um frio de rachar, e elas lá! Aliás, sabia que ontem tinha um supermercado (mini) 24 horas, bem no centro? Ontem, eu não fazia ideia de quantos rios tinham na cidade. Muito menos ouvia falar de bacias, sub-bacias. Hoje, já tem até grandes obras de drenagem, etc. E como tem rios a nossa cidade, hein?  
              Hoje, tenho filhos. Ontem eu pensava no que poderia fazer para que a vida deles fosse um pouco melhor morando aqui. Eu “morria de medo” que eles só tivessem shopping centers para se enfurnarem  no final de semana. Quando eles eram menorzinhos, a gente ia no estacionamento do Centreventos, ali onde hoje é  o Edmundo Dowbrava, eu e a minha mulher sentávamos  numa cadeira de praia, enquanto eles andavam de bicicleta. Era o nosso parque ao ar livre.  
             Ontem, também não tinha tantos carros nas ruas. Era mais fácil de andar pela cidade. Ontem, tinha muita enchente nos bairros com qualquer chuvinha. Anteontem tinha uma Festa das Flores bem bonita. Ontem, ela já não era tão festejada assim. Hoje, óóó! Linda! Ontem, a gente nem ouvia falar das festas populares. Hoje, eu já lembro, de cara, de umas quantas. Ontem, ninguém convidava a gente para um passeio para conhecer a própria cidade, a área rural. Hoje, a gente faz roteiro de bicicleta. Ontem, não se podia falar de política. Falar da prefeitura, da administração, então, nem pensar.  Não era bom! Hoje já pode. Ontem, o grande time de futebol ganhava vários títulos. Ontem, a gente sofreu em série. Hoje, a gente já sonha com A. Aliás, eu não vou esquecer nunca daquele dia que o nosso time subiu para a B e foi uma multidão ver o jogo, ao vivo, num telão, instalado pela prefeitura, lá no Mercado Municipal. A gente se sentiu unido, junto, feliz da vida!  
              Ontem, eu falava com orgulho de onde eu morava, por causa das empresas mundiais instaladas aqui. Hoje, eu também falo das escolas municipais, do parque, das academias ao ar livre e que a gente vai ter saneamento básico – um problema de trás-anteontem.
              E eu que não quero comparar. Mas refletir. Com mais liberdade de escolha. Com acessibilidade a uma cidade que eu gosto tanto. Sentadinho no banco da praça, com os filhos brincando ao redor e conversando com os amigos.

(Pierre, julho de 2012)

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